Publicado em: 05/06/2024
Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, a Synergia Socioambiental convidou a pesquisadora, Dra. Marília Campos, para discutir um tema urgente para o nosso planeta: o ponto de não retorno da Amazônia, o maior bioma brasileiro.
A Floresta Amazônica é a maior floresta tropical úmida do mundo, abriga a maior biodiversidade dentre os ecossistemas terrestres, e desempenha papel fundamental na regulação climática global. Essa floresta tem resistido à variabilidade climática natural ao longo de milhares de anos. No entanto, nas últimas décadas, o efeito conjunto das mudanças climáticas induzidas pelo homem e das pressões de atividades econômicas tem ameaçado sua sustentabilidade. Estudos recentes apontam que a Floresta Amazônica pode atingir um ponto de não retorno ainda neste século.
Mas, afinal, o que é ponto de não retorno?
Um ponto de não retorno pode ser entendido como “um limite crítico no qual uma pequena perturbação pode alterar qualitativamente o estado ou desenvolvimento de um sistema”. Este conceito pode ser aplicado em diversas áreas, mas, neste caso, estamos nos referindo a um ponto de não retorno do sistema climático da Terra.
Em outras palavras, este conceito está relacionado com uma mudança significativa de comportamento de um dado componente do sistema climático forçada por algum fator climático crítico, por exemplo, o aquecimento global.
Ou seja, quando há uma ou mais forças interferindo sobre o sistema climático, a sua resposta pode ser uma mudança abrupta de comportamento, independente dessa força continuar ou não atuando sobre ele.
E como é definido o ponto de não retorno da Amazônia?
O ponto de não retorno da Floresta Amazônica é referente a possibilidade desse bioma sofrer um processo de savanização. Além das pressões de atividades econômicas sobre essa floresta, a sua possível savanização está associada com o prolongamento da estação seca juntamente com o aumento na frequência e/ou severidade de eventos extremos de seca na região. Tais fenômenos climáticos já vêm sendo observados e as projeções climáticas futuras indicam que eles serão mais intensos em cenários de maior aquecimento global, podendo implicar na perda de até 70% das árvores desse bioma. Nesse cenário, vastas áreas de floresta tropical úmida seriam substituídas por savana, vegetação típica de regiões mais secas, composta principalmente por gramíneas, arbustos e árvores esparsas. No Brasil, a savana é conhecida como cerrado, vegetação típica da região semiárida nordestina.
Se atingirmos o ponto de não retorno, o que pode mudar?
A savanização da Floresta Amazônica resultaria em perda significativa de biodiversidade, grande liberação de CO2 para a atmosfera e teria impactos significativos nos padrões de chuva em uma ampla área da América do Sul3. Em suma, teríamos grandes impactos socioeconômicos, culturais e ambientais.
Qual o impacto do ponto de não retorno da Amazônia no restante do mundo?
É importante frisar que a Floresta Amazônica não é o único componente do sistema climático com possibilidade de atingimento de um ponto de não retorno. Vários outros componentes foram inclusos nessa lista . E existe uma crescente preocupação com os efeitos das interações entre esses pontos de não retorno. Quando um ponto de não retorno é atingido, a probabilidade de atingimento de pontos de não retorno de outros componentes do sistema climático pode aumentar.
De que forma essas interações entre os pontos de não retorno podem acelerar o processo de savanização da Floresta Amazônica?
Dois pontos de não retorno podem ter influência direta e significativa no processo de savanização da Floresta Amazônica: o colapso da circulação no oceano Atlântico e mudanças na intensidade e/ou frequência de eventos El Niño.
No primeiro caso, o colapso da circulação no Atlântico implicaria no deslocamento para sul do cinturão de precipitação tropical, promovendo uma redução de precipitação na região norte da Floresta Amazônica e aumento na região sul, favorecendo a savanização do norte. No entanto, como a frente de desmatamento nessa floresta se dá especialmente na sua região sul, a floresta como um todo pode ser afetada.
Já no segundo caso, um dos impactos associados aos eventos El Niño é a redução de chuvas e aumento de temperatura na região amazônica. Assim, um aumento na intensidade e/ou frequência desses eventos poderia acelerar o processo de savanização dessa floresta.
“Estamos vivendo um momento de emergência climática no qual precisamos refletir sobre o planeta que queremos viver nas próximas décadas e quais condições iremos legar para as gerações futuras. Ações individuais, quando combinadas, têm o poder de gerar um impacto significativo.”
E como as instituições podem atuar frente a esse cenário?
O Brasil possui grande heterogeneidade de relevos e tipos de vegetação que, quando expostos a eventos climáticos extremos, podem resultar na ocorrência de desastres naturais. A participação ativa de empresas nesse cenário de emergência climática torna-se urgente e necessária como, por exemplo, na elaboração de planos de ação e de adaptação climática eficazes, que visem o bem-estar da sociedade e a perenidade dos negócios.
Muitas vezes tal tarefa é um desafio, que demanda união de esforços e cooperação entre diferentes atores. Entretanto, quando as empresas passam a seguir este caminho sustentável, conseguem impactar positivamente, seja de forma direta ou indireta, contribuindo para evitar e/ou minimizar os efeitos dos eventos climáticos extremos.
O planejamento estratégico das empresas deve seguir modelos mais sustentáveis, ter como um dos principais objetivos a mitigação dos efeitos de eventos climáticos extremos e ter metas alinhadas com a redução das emissões de gases de efeito estufa.
Além disso, é importante assimilar a gravidade dos impactos destes extremos climáticos para as pessoas que residem em áreas de vulnerabilidade climática, territorial e socioeconômica, traçando objetivos que combatam também as desigualdades socioambientais.
O setor privado tem a responsabilidade de estruturar um ambiente diverso, com representatividade e equidade para a tomada de decisão a partir dos atores envolvidos e de suas perspectivas únicas sobre a forma como serão impactados pelas empresas.
Conscientes dos desafios impostos pelas mudanças climáticas, devemos atuar como agentes de transformação, criando uma rede de colaboração entre empresas e outros setores e compreendendo a complexidade dos impactos em todos os âmbitos da humanidade e do planeta.
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