Campanha

Synergia na COP26

Publicado em: 01/11/2021

Synergia na cop26: cobertura diária

A Synergia acompanhou a COP26 – a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, e compartilhou as principais informações aqui nesta página. Os acontecimentos mais relevantes e as discussões diárias da conferência foram relatados por Luiz Eduardo Rielli, nosso consultor em sustentabilidade, que participou do evento presencialmente em Glasgow, na Escócia, e Ricardo Young, membro do conselho consultivo da Synergia.

Eles trouxeram suas percepções sobre os assuntos da COP26 baseando-se em temas relevantes para a Synergia, como empregabilidade, gênero e diversidade, desenvolvimento do “Global South”, resiliência e adaptação de comunidades.

A COP26 é a conferência anual mais importante do mundo no debate das questões do clima. Ela reúne líderes mundiais para definir estratégias globais de combate às mudanças climáticas e de prevenção aos desastres ligados a elas, que causam milhares de mortes, imigrações forçadas e grandes prejuízos sociais e econômicos.

Este ano (2021), a conferência aconteceu de 31 de outubro a 12 de novembro, e teve foco na atualização dos planos para a redução de emissões de gases de efeito estufa, feitos pelos países participantes do Acordo de Paris, em 2015. Temas relacionados aos direitos humanos, desigualdade social e apoio aos países mais pobres também estiveram em pauta.

Confira a cobertura e as atualizações diárias da COP26

 

Synergia na COP26 Resultados e perspectivas


Confira a análise completa da COP26, realizada por Luiz Eduardo Rielli, nosso consultor em sustentabilidade, e Alexandre Araújo, assessor estratégico de sustentabilidade da Synergia.

Neste encontro, realizado dia 17/11/21, Rielli apresentou para colaboradores e colaboradoras da Synergia as suas perspectivas sobre a COP26, os desdobramentos da conferência e, ainda, junto com Alexandre, tirou dúvidas dos/as participantes sobre os principais temas abordados:

  • O que é a COP e qual a sua importância;
  • Como foi realizado o evento
  • Participação do Brasil na COP26
  • Resultados gerais
  • Resultados específicos
  • Pontos de atenção

Saber os resultados e perspectivas desse importante evento é uma forma de ampliar seus conhecimentos sobre os novos pactos traçados para refrear as mudanças climáticas e alcançar metas de sustentabilidade universais, temas tão importantes para a atualidade. Então, assista ao vídeo!

Confira a análise completa da COP26.

Algumas questões sobre a COP26 e a participação da Synergia ficaram para a resposta posterior de Luiz Rielli. Confira abaixo as perguntas feitas pelos/as participantes, divididas por temas, e as respostas do nosso consultor.

NEGOCIAÇÃO

  • Como foi o mercado de negociação de dívidas do FMI para redução de carbono? Isso vingou no final da COP 26?
  • No item CASH, os US$100bi/ano será alcançado em 2023 ou 2033?
  • Na sua visão como ficou o comprometimento dos EUA e China na COP26?
  • Foram discutidas estratégias de acolhimento dos refugiados da emergência climática?
  • A principal ambição de Glasgow era ter ambição e aceleração maiores. Você acha que o aporte de recursos financeiros de países desenvolvidos em países em desenvolvimento para atingir metas mais ambiciosas no mundo como um todo foi concretizada conforme o esperado? Ou isso foi aquém?
  • Como você avalia a participação da sociedade civil como pressão para as tomadas de decisão dos líderes globais? Você entende que isso dará continuidade com força? Viu algum movimento inovador?
  • O Brasil colocou alguma ação concreta para redução da emissão de metano?
  • O tema de Soluções Baseadas na Natureza foi muito abordado, especialmente na primeira semana. Você identificou oportunidades para o Brasil nesta área?

O tema da dívida foi amplamente debatido, especialmente pelos países africanos, mas também por organismos internacionais como a OCDE e FMI. O ponto central é que países menos desenvolvidos não possuem espaço fiscal para obter novas linhas de financiamento para as transições de baixo carbono requeridas. Ou seja, mesmo que haja nos fluxos financeiros, esses países não teriam capacidade de utilizar esses recursos. Não houve conclusões finais sobre esse tema. Segue em negociação. O valor de US$100bi/ano deverá ser alcançado até 2023, segundo estimativas do Banco Mundial. O fluxo financeiro está ainda muito aquém ao necessário para alavancar as transições de baixo carbono e os efeitos das mudanças do clima na maior parte dos países do mundo.

O tema de refugiados climáticos não é um tema formal das negociações. Entretanto, ele é inerente a outros temas que foram muito debatidos – perdas&danos; adaptação; financiamento. Não tive muito contato sobre estratégias de acolhimento nas conversas oficiais. Algo a ser explorado.

As relações entre China e Estados Unidos andam em seu ponto de mais alta tensão, com o enfoque da administração Biden na aliança militar na Ásia-Pacífico. É evidente que o eixo de disputa e poder global está nessa região. Por isso, se esperava muito pouco das relações China e EUA. Também, por isso, se atribui a razão do presidente chinês não ter ido à COP26. Por fim, houve um comunicado conjunto: “Temos muitas diferenças, mas em clima, cooperação é a única maneira de ter esse trabalho feito” (tradução livre). Confira a declaração conjunta EUA-China.

Sobre o compromisso de metano, o Brasil não assumiu compromissos adicionais. Leia a nota oficial com a posição brasileira de redução de emissão de metano e declaração de florestas e uso da terra.

CONSEQUÊNCIAS

  • No tema da Amazônia, qual imagem fica do Brasil em sua opinião? Foram debatidos instrumentos efetivos de pressão sobre o governo brasileiro para controle do desmatamento?
  • Poderia explicar melhor o ponto de atenção relacionado a grupos vulneráveis?
  • Enquanto vários delegados se reuniam na COP, algumas notícias sobre poluição extrema foram noticiadas, como a alta poluição do ar derivada de ação industrial e espuma tóxica em rios, ambas em Nova Delhi. Esse tipo de situação foi debatida? Ações emergenciais?
  • Considerando os resultados apresentados, de que modo o Brasil colocará em prática, de forma faseada, cada uma das metas? Quais atores a envolver? A atual legislação ambiental brasileira terá que se adequar e/ou vincular obrigatoriamente às novas exigências saídas da COP?
  • No que respeita à região amazônica brasileira, foi feita alguma exigência formal junto do atual governo brasileiro, com implicações diretas para as suas populações locais e investimentos privados na região visada?
  • Como foi a atuação do Brasil tratando-se de populações tradicionais (grupo de vulneráveis), considerando o atual governo?
  • Eu tenho uma curiosidade: existem conversas de corredores, comentários em horário de café sobre a atual situação política do Brasil, diante das atrocidades (desmatamento, incêndios, falta de demarcação de terras indígenas, perseguição e morte de líderes indígenas etc.)? Como as pessoas reagem ao encontrar um brasileiro, como você: com compaixão, com humor, com desânimo? O que você ouviu sobre o governo Bolsonaro?

Pessoalmente, o sentimento geral é de choque, inconformismo e pena.

Certamente a imagem do Brasil está diretamente associada à Amazônia. Não apenas na COP26. Em qualquer roda de conversa no exterior, a pergunta é “Quando o Brasil irá parar de derrubar a floresta?”. Especificamente, diplomatas do Gabão, Portugal e Colômbia me fizeram essa pergunta. A pressão para controle de desmatamento está no financiamento e nas compras. Governos não querem repassar recursos sem governança forte, controles e transparência. As exigências já tinham sido feitas pelos doadores de projetos na Amazônia: Alemanha, Noruega, EUA, etc. Novos compromissos de financiamento foram feitos envolvendo diretamente as comunidades e governos locais. O atual governo brasileiro desconsidera esses atores.

No lado das negociações formais, as mensagens foram veladas, mas sempre trazidas à mesa de maneira clara como um elemento crítico. Por outro lado, a posição do governo federal brasileiro pode ser resumida pela fala de uma alta autoridade: “devemos retomar narrativas. Não deixar o país só apanhar”. Na minha opinião, é uma posição inócua. Serve só para alegrar um pequeno grupo de seguidores no contexto interno do Brasil. A comunidade internacional tem clareza dos fatos que estão ocorrendo no Brasil.

Lembrando que os acordos internacionais só passam a ser vinculantes na legislação brasileira após aprovação do Congresso. O Brasil já possui a Política de Clima e seus compromissos (NDCs) já estão em legislação. Os novos compromissos também estão previstos em mecanismos normativos. O problema, em grande medida, é de implementação, articulação e prioridade política, alocação orçamentária.

OPORTUNIDADES

  • Diante dos resultados da COP 26, quais as oportunidades hidrológicas comerciais que você visualiza para a Synergia e como operacionalizá-los?
  • Quais são as principais oportunidades para o Brasil após resultados da COP 26? A forma como serão disponibilizados os fundos de apoio a projetos de redução do clima e conservação de florestas está clara?
  • Como a Synergia pretende canalizar todo o conhecimento e as medidas recomendadas para a sua prática junto aos públicos-alvo? Existe um plano preliminar para isso?

O Brasil sempre esteve em posição muito favorável na temática de clima. Obviamente, por sua riqueza natural e por uma matriz elétrica fundamentalmente de origens renováveis. Isso não significa que o país deva entender que não deve buscar sua própria transição para uma economia de baixo carbono. As oportunidades virão dos biocombustíveis, das biomassas, dos ativos ambientais, de alimentos que tenham baixo impacto.  No contexto da COP, o mundo vê o Brasil como provedor de alimentos, de recursos naturais e o garantir do equilíbrio climático com a manutenção da floresta em pé.

Nesse sentido, a Synergia terá oportunidades vinculadas a uma melhor governança, transparência, controles e rastreabilidade de projetos e de cadeias de suprimentos globais. Também poderá contribuir com estratégias, planos, articulações, engajamentos. Isso poderá se basear em modelos de desenvolvimento territorial, inteligência socioambiental utilizando dados, entre outros. Enfim, poderá alavancar seus conhecimentos e competências em prol do desenvolvimento das pessoas e comunidades que contribuam com o desafio global do clima. É um caminho que precisa ter uma visão amadurecida e plano bem definido.

 

Dia 15/11 – Encerramento


Por Luiz Eduardo Rielli

COP26: avanços ou fracassos?

Neste momento, oficialmente, já foram concluídos 26 encontros dos países-partes da Conferência Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima. Ao final de todos esses encontros a pergunta que circula entre os corredores, a imprensa e os grupos de interesse associados à pauta climática é: e aí? A COP26 teve avanços ou retrocessos? O que isso muda para o Brasil? Talvez pela complexidade e abrangência das pautas, o entendimento do que ocorreu nesse grande encontro internacional precisa ser avaliado com cautela e sob diferentes perspectivas.

Para fazer essa análise é importante entender as negociações do clima dentro de um contexto maior das relações internacionais e das políticas internas de seus principais atores. Nesse sentido, é positivo o momento da agenda americana do presidente Biden, o Build Back Better, considerando a retomada econômica americana a partir de um modelo de baixo carbono – e da Europa, com seu Pacto Ecológico.  Por outro lado, a ausência do peso político decisivo da China e do Brasil dificultaram um acordo ainda mais abrangente. Outros atores relevantes como Índia, África do Sul, Austrália e os países do Oriente Médio, com sociedades dependentes dos combustíveis fósseis, buscam posições compensatórias e transições graduais.

Foto: Adobe Stock

Também é fundamental compreender a COP26 dentro de um ciclo de debates, encontros e negociações maior, nesse momento sob a presidência do Reino Unido. Isso porque o que foi decidido em Glasgow já havia sido debatido anteriormente por cada país internamente e em encontros como o G7 e o G20. Os mandatos, posições e compromissos já estavam dados, em grande medida. Nesse sentido, pode-se dizer que o Reino Unido fez um grande esforço para que o encontro presencial de Glasgow ocorresse tanto em termos de investimentos financeiros, logísticos (garantindo a saúde de todos no contexto da COVID19) e, principalmente, político. Pode-se afirmar que foi fundamental o papel do Reino Unido em retomar o Acordo de Paris e dar ritmo aos seus compromissos e ambições. A analogia utilizada nos encontros é que nessa “jornada” de um mundo de baixo carbono, o Acordo de Paris oferecia um “trilho”, mas Glasgow deveria ser a “locomotiva” impulsionadora.

O que aumentou a pressão sobre a COP26 – e é fundamental para avaliar os seus resultados – foram as novas evidências e relatórios científicos. O 6º relatório do IPCC – painel científico que consolida consensos das ciências climáticas – indicou, com maior grau de certeza, as origens das mudanças do clima e, principalmente, seus efeitos sobre subsistemas climáticos e dinâmicas naturais. A urgência de ações foi colocada na mesa. A “janela de tempo” para que medidas reais sejam tomadas está acabando, se quisermos evitar as consequências brutais e desconhecidas das mudanças do clima.

No momento em que este artigo é escrito, analistas de todo o mundo estão debruçados sobre os documentos finais que acabaram de ser disponibilizados, revisando cada parágrafo dos 7 grandes temas que estavam em negociação. De maneira sintética, indico algumas avaliações:

  • (+) Há um sinal claro de que investimentos em combustíveis fósseis serão reduzidos. Pela primeira vez há a citação direta aos efeitos negativos dos combustíveis fósseis, com ênfase à necessidade de redução do carvão mineral e dos subsídios aos combustíveis fósseis;
  • (+) Há um entendimento de que as mudanças do clima são reais e urgentes. Os debates fortaleceram o papel da ciência e de suas descobertas. Glasgow retomou o tempo perdido;
  • (+) Há uma preocupação com o efeito das ações e mecanismos para combater as mudanças do clima sobre as pessoas. Nesse sentido, o tema de direitos humanos, equidade, juventude e gênero teve forte presença nos textos finais.
  • (-) Não há clareza sobre uma plataforma consistente de aumento de ambições dos países, alinhados ao compromisso de manter o aumento de temperatura em 1,5ºC, conforme previsto no Acordo de Paris;
  • (-) Interesses – muitas vezes legítimos e soberanos – de países-chave como Índia, China, África do Sul, Austrália e Canadá dificultam o avanço de acordos globais, abrangentes e ambiciosos.

Muitos são os temas que foram intensamente debatidos como, por exemplo, fim do desmatamento, financiamento climático, o fundo de US$100 bilhões/ano, perdas&danos, adaptação, o novo mercado de carbono (Art. 6º do Acordo de Paris). Há certamente avanços – como no tema de florestas e mercado de carbono – e frustrações – como em perdas&danos e financiamento climático.

Glasgow teve avanços e fracassos. A presidência do Reino Unido ofereceu novo fôlego e ânimo às negociações climáticas e remobilizou atores de todo mundo de volta à urgência climática. Novos compromissos foram ofertados. Novas ações foram anunciadas. Entretanto, apesar de Glasgow ter oferecido muito, deveria ter avançado mais. Esta é, definitivamente a década de medidas reais e de rápida implementação e parece que ainda não temos um pacote de ações suficientes. Por fim, há dúvidas se os próximos encontros, no Egito e nos Emirados Árabes Unidos conseguirão alavancar ainda mais as ações e compromissos.

 

Dia 12/11


Por Ricardo Young

Assimetria entre ambição e inação

Não há dúvida de que ao se encerrar a COP26 o mundo está devidamente consciente da catástrofe que o aquecimento global trará para a vida no planeta. Na reunião plenária realizada hoje, último dia do evento, para a análise da segunda versão do rascunho do relatório final, não foram poucas as falas inflamadas dos delegados com apelos dramáticos para que não se abandonasse a meta do Acordo de Paris de manter-se o aquecimento em no máximo 1,5ºC. E esta preocupação não era sem razão: a soma das novas NDCs (National Determined Contributions) apresentadas pelos países somavam ainda emissões que elevariam a temperatura a 2,4º C.

Além dos esforços de mitigação, a consciência sobre os custos de adaptação e dos efeitos devastadores dos eventos climáticos extremos sobre os países mais vulneráveis acendeu uma maior preocupação do bloco 77+China (bloco dos países em desenvolvimento que somados possuem mais de 80% da população mundial) de que os recursos prometidos e incrementados pelos países desenvolvidos a estes países para a adaptação mais pareciam prêmios de consolação para compensá-los. A expectativa é de que estes recursos sirvam, sobretudo, para acelerar a capacidade de adaptação e de transição destes países para a economia descarbonizada.

Movimento “Fridays for Future”. Foto de ações Shutterstock.com

Enquanto a menção aos direitos humanos, das gerações futuras e a ameaça de desaparecimento de nações inteiras e seus legados  poderiam parecer apenas uma declaração dramática quando o representante de Tuvalu disse que seu país estava submergindo literalmente sob as ondas (apesar de pequeno e com menos de 20 mil habitantes, Tuvalu está prestes a engrossar as estatísticas de centenas de milhares potenciais refugiados climáticos se nada for feito), o vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermmans, disse que em 2050 seu neto de um ano estaria lutando desesperadamente na disputa por alimento e água, brandindo seu celular com a foto do garoto. A plenária entre aplausos e perplexidade, ficou pasma.

Foi uma reunião tensa onde, apesar da boa vontade, do apoio ao sistema multilateral, da reafirmação do Acordo de Paris, vários delegados levantaram a assimetria entre as intenções e os compromissos, entre a ambição e a ação.

Os principais pontos abordados, e onde os consensos estão difíceis, estão relacionados a:

1)      Periodicidade da revisão das NDCs. O Acordo de Paris previu um intervalo de 5 anos para a revisão das metas. Frente à insuficiência da ambição agregada, a proposta é que as NDCs sejam revisadas anualmente.

2)      A compensação pelas perdas e danos e pelos custos de adaptação dos países mais vulneráveis. O bloco de 77 países, incluindo a China, acredita que os países mais ricos têm o dever moral de compensá-los por terem sido àqueles que se beneficiaram do crescimento baseado em carbono. Além dos $100 bilhões já acordados de ajuda anual, um valor adicional será acrescido a este montante e há uma preocupação de quando e como estes recursos serão transferidos para estes países.

3)      O famoso Artigo 6 do Acordo de Paris deverá ser finalmente regulamentado, mas há uma preocupação de que o mercado de carbono se torne um subterfúgio para que os países emissores continuem usando-o como pretexto, com o risco de banalizá-lo como uma das mais poderosas ferramentas para se regular as emissões e evitar que países em desenvolvimento aumentem as suas.

4)      A forma de reporte e mensuração do carbono emitido pelos países, a necessidade de sua uniformização para que as emissões não sejam subestimadas e nem fraudadas.

Além destes pontos, considera-se que a segunda versão do documento em discussão no decorrer desta sexta-feira foi leniente com as metas iniciais, mais duras com os combustíveis fósseis. Da proposta de eliminação progressiva acompanhada de metas de redução, o documento trouxe o conceito de redução de emissões, uso mais eficiente destes combustíveis e eliminação de subsídios àqueles menos eficientes. Suspeita-se aqui da influência do poderoso lobby de produtores de carvão e petróleo.

Outros aspectos do documento trazem alento em relação ao futuro: maior comprometimento financeiro dos países com adaptação além da mitigação; maior esforço global público e privado com recursos para a transição energética, para tecnologias e projetos de descarbonização; revisão periódica de metas de emissão e maior colaboração internacional para acelerar-se a transição para uma economia de baixo carbono.

Não podemos dizer que Glasgow fracassou, mas não deixa a marca histórica esperada. A dificuldade de os países consertarem o futuro do planeta, ao mesmo tempo que precisam fazer ajustes domésticos custosos política e economicamente, cria uma fissura entre a ambição e a capacidade objetiva de ação na escala esperada.

Talvez seja a hora dos dirigentes nacionais investirem-se de maior responsabilidade global e compreenderem que a geração Greta é a que crescentemente irá ditar as regras das ruas, das manifestações, das redes sociais com presença mundial. A sociedade civil global representará uma dimensão adicional ao desafio de governança multilateral e nacional, com implicações políticas ainda imprevisíveis.

 

Dia 11/11


Por Luiz Eduardo Rielli

Cidades, regiões e edificações em pauta

Hoje o dia aqui na COP26 foi pautado pelas Cidades, Regiões e Edificações, um tema bastante importante, que parte tanto da abordagem das comunidades quanto de governos.

Na abordagem por parte das comunidades e localidades considera-se o que as pessoas e seus grupos podem fazer em seus territórios para se adaptarem às consequências das mudanças do clima e para evitar que ocorram. Estamos falando de projetos de organização comunitária, tecnologia de construção de baixo impacto local e mutirão de construções, por exemplo.

Outra abordagem, mais complexa, diz respeito à organização dos países e regiões como um todo, como grandes planejamentos urbanos, financiamentos para novos tipos de construção e assim por diante.

Um aspecto interessante também quando se fala de Cidades e Edificações é o tema de adaptação, porque a maior parte da infraestrutura dos países ricos, e também dos países em desenvolvimento, não foi feita para aguentar os impactos das mudanças climáticas.

Vou dar um exemplo: a maior parte da infraestrutura brasileira é da segunda metade do século XX, quando as grandes cidades começaram a crescer. Os postes, as pontes e as ruas não foram feitas para grandes eventos extremos. Se um poste foi tecnicamente feito para aguentar ventos de 50 km por hora, por exemplo, o que acontecerá se tivermos eventos extremos mais significativos, com ventos acima de 60, 70 ou 80 km por hora?

Então, o grande tema de discussão para as cidades foi a questão da adaptação. Muitas das cidades em adaptação estão olhando tanto para a infraestrutura quanto para a prevenção. Isso é muito bom.

Por fim, na temática de Edificações, a abordagem foi muito tecnológica aqui na COP26, especialmente no que se refere a novos métodos construtivos, novos materiais, novas estruturas. Um bom exemplo é a construção à base de madeira estrutural, algo impensado há 10 anos. Hoje já existem, em muitos países ricos, como no norte da Europa, prédios com até 20 andares construídos de madeira.

Também novos materiais, como os bio-tijolos a partir de resíduos ou reciclados, foram muito discutidos como solução para edificações além da questão da eficiência energética. Afinal, uma grande questão é como transformar as casas e os prédios das pessoas em moradias com baixo consumo energético, especialmente em países com frio intenso.

Em resumo, hoje foi um dia importante com discussões e soluções vindas das duas pontas: governos e sociedades.


Confira o relato de Rielli sobre como as mudanças no clima vão afetar as pessoas que vivem no ambiente urbano.

 

Dia 10/11


Por Luiz Eduardo Rielli

 Velocidade e inovação pautam as conversas

Estamos concluindo o 10º dia da COP26 e este é o momento em que começam a afunilar as conclusões, os documentos finais. Especificamente, os subgrupos e grupos de trabalhos começam a entregar suas propostas para concluir num texto final.

São sete subgrupos de grande importância para o futuro climático e cada um deles terá seu documento norteador sobre:

  1. Mercado de carbono
  2. NDCs – compromissos dos países
  3. Transparência
  4. Adaptação
  5. Perdas e danos aos países menos desenvolvidos
  6. Finanças climáticas
  7. Mitigação e compromisso com aumento da temperatura até 1,5°C

Alguns avanços foram feitos em cada um dos subgrupos, porém o sentimento geral é de que devemos ter mais ambição e velocidade para as ações. O grande mote é conseguir ter velocidade na implementação de projetos. É o que todos estão falando aqui: fazer mais e com mais rapidez. Isso vale para o tema de hoje, de transportes, mas também para todos os demais temas.

Outra mensagem forte é que todos concordam com o senso de urgência e que é necessário ter ações alinhadas com a ciência. Comenta-se em todas as rodas de conversa, e também nas diversas sessões, que é preciso agir e em paralelo ir buscando mais inovação.

Isso é muito importante, especialmente para o setor privado, pois gera oportunidades de negócios, de novos projetos. Vimos novos fundos sendo apresentados pelos países ricos, sendo uma oportunidade de novas atividades para países como o Brasil.

Confira no vídeo de hoje, o relato de Rielli sobre o tema transportes e o fim do carro à combustão.

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Por Ricardo Young

 A Cop 26 e a nova forma de se fazer negócios

Não é novidade que a comunidade empresarial global vem procurando responder, com um novo modelo de negócios, às sucessivas pressões que tem recebido de vários setores da sociedade. Desde a emblemática declaração de Larry Fink, em 2019, em que sinaliza de forma enfática que o mercado financeiro deveria investir prioritariamente em empresas ESG, vários outros eventos vieram se somar a este chamado.

O Fórum de Davos, de 2020 e 2021, trouxe a fala de um novo recomeço, do que seria ‘o fim do capitalismo de acionistas para o início do capitalismo das partes interessadas’, nas palavras de seu fundador, Klaus Schwab; o NY Business Roundtable, que reúne os principais CEOs dos EUA, seguiu na mesma direção; o lançamento do Pacto Ecológico Europeu, outros acordos e diversas manifestações fizeram com que o conceito ESG viesse a ter uma enorme centralidade nos mercados, conferências, escolas de negócio e entidades empresariais.

No entanto, o conceito ESG não é para amadores. Ele surge na sua dimensão S ainda no início dos anos 90, adquire a sua dimensão E, no decorrer da década de 2000 e a sua dimensão G a partir da segunda metade da década de 2010.

Portanto, as habilidades e competências nas áreas social, ambiental e de governança nascem de forma relativamente independente. Mas assumem a sua forma sistêmica em fins de 2019, e sua centralidade absoluta agora, na COP 26.

Se a sigla ESG representa a resposta necessária para as formidáveis mudanças requeridas pelos desafios do clima, a sua compreensão redefine o próprio conceito do que empresariar significa.

O documento lançado na terça-feira pelo Instituto Ethos e várias empresas, no evento Elevando a Ambição da NDC brasileira e os caminhos de descarbonização para o Brasil, realizado na COP26, evidencia com clareza quais são as inflexões necessárias à cultura tradicional de gestão. Não se trata de melhor compliance, nem de indicadores tipo GRI, nem mesmo de investimentos sociais privados, inclusão e diversidade.

Trata-se de uma nova mentalidade de negócios, onde a centralidade passa a ser a geração de valores mensuráveis para todas as partes interessadas com materialidade, múltiplos indicadores sistêmicos, avaliação de impacto na cadeia de valor, engajamento dialogado e diferencial dos colaboradores e de todas as partes envolvidas. Conceitos tradicionais como KPIs, Capex, EBIDTA, TIR, Dashboards, políticas de bonificação, planejamento estratégico e outras ferramentas tão importantes terão agora que incorporar as novas dimensões da gestão.

O documento lançado, intitulado Propostas e Recomendações Empresariais para a NDC Brasileira, estabelece compromissos empresariais, tais como:

·        garantir a rastreabilidade das cadeias produtivas e assegurar a transparência dos impactos da sua atuação para a sociedade;

·        adotar políticas corporativas e planos de gestão empresarial que promovam mitigação e adaptação a mudança do clima em suas operações diretas e nas suas cadeias;

·        adotar políticas corporativas e planos de gestão empresarial que promovam uso sustentável dos recursos da natureza e preservação da biodiversidade;

·        incorporar as diretrizes de direitos humanos nas políticas e práticas corporativas, vinculando-os à qualidade de vida e ao direito de bem-estar ambiental, e vários outros, inclusive de diretrizes de advocacy e incidência em políticas públicas.

Várias empresas aderiram a este documento e muitas mais irão aderir. E isso significará uma revolução na gestão tradicional das organizações.

Ao menos algumas empresas presentes no evento concordam com isso. Paulo Pianez, da Marfrig, Denise Hills, da Natura, e Lucia Rodrigues, da Microsoft, demonstraram como estão aplicando estes princípios e como suas empresas começam a ser referência em gestão ESG –  diga-se, gestão sustentável – para que não só possam ter incidência sobre as mudanças, mas que possam também protagonizar um nova mentalidade em se fazer negócios.

Esta competência irá definir quem fica e quem deixa este novo mercado.

 

Dia 09/11


Por Luiz Eduardo Rielli

Diversidade de gênero, ciência e inovação foram as pautas de hoje

Confira o vídeo de hoje!

Por Ricardo Young

Uma nova cidadania possível? Uma outra cidadania é inadiável!

Esta semana em Glasgow começou com um mal-estar, uma sombra generalizada pairando sobre os resultados dessa Conferência, chave para o futuro da vida no planeta.

Por um lado, e apesar das declarações otimistas dos delegados representantes dos países signatários do Acordo de Paris, as NDCs (Contribuição Nacionalmente Determinada, em inglês) somadas até agora, ainda não garantem a redução do aquecimento global em 1,5 ºC até o final do século. Ao contrário, apontam para um aquecimento na ordem de 2,7 ºC trazendo perspectivas pessimistas para a semana. Por outro, não foi por outra razão que Greta Thunberg iniciou, já na sexta-feira, manifestações que reuniram milhares de jovens ao redor do mundo, proclamando o fracasso da Conferência. A geração ‘saqueada’ dos seus direitos futuros, resolveu radicalizá-los no presente denunciando o que seria “um fracasso” em suas próprias palavras.

A tendência das declarações dadas por chefes de estado e seus representantes terem um objetivo mais político ao invés de compromissos reais, já é conhecida nas COPs desde sempre. Em geral, eles falam aos públicos domésticos e não necessariamente para o mundo. Isto explica, entre outras causas, a lentidão com que as decisões são tomadas. Idas e voltas, descontinuidade na alternância de mandatos adversários, crises de todos os tipos, negacionismos e outras razões têm adiado decisões e políticas agora evidentes como inadiáveis. A juventude sabe disso e não está com disposição para enrolações, adiamentos e greenwashing político. A hora é grave e o escrutínio das novas gerações será crescentemente implacável.

Ativista Greta Thunberg em protesto na COP26
Greta Thunberg lidera manifestação que reuniu milhares de jovens durante a COP26. Foto: LWF/Albin Hillert

No entanto, a crise climática impõe uma reflexão sobre qual democracia precisamos e de que cidadania deveremos exercer. De que democracia estamos falando mesmo?

A democracia em sua forma moderna, do pós-guerra até os dias de hoje, foi um espaço de pluralidade, disputa de direitos, embate de classes sociais e econômicas, reivindicações, disputa ideológica, disputa política e uma busca incessante pela liberdade, pela igualdade, pelo direito de existir e ser sujeito de sua própria história. Pois bem, com passos à frente e retrocessos, chegamos à civilização presente que, ao mirar-se no último relatório do IPCC, se revela na barbárie cometida contra a vida e contra o planeta. Trata-se de uma crise de modelo político, do modelo capitalista, um esgotamento ao final, da democracia propriamente dita?

A meu ver, não. Trata-se de uma crise de paradigma, de visão de mundo, de percepção sistêmica. A sustentabilidade pressupõe diversidade, transversalidade, interdisciplinaridade. Mas pressupõe também colaboração, interatividade, interdependência, inteligência de rede e visão complexa. Portanto, a democracia que a era da sustentabilidade clama tem outros adjetivos: não se trata mais do embate, da disputa pela supremacia, da concorrência, da meritocracia, da lei do mais forte e, sim, da colaboração, da solidariedade, da regeneração, da economia da restauração, da renúncia ao consumismo, da valorização do diverso, da equidade, da ciência e do conhecimento a serviço do todo.

Não haverá desenvolvimento sustentável possível sem inclusão social, com pobreza generalizada, sem dignidade e profundo respeito por todas as formas de vida, como aliás, a Carta da Terra enunciou há mais de duas décadas. A democracia que conhecemos até aqui, falhou em sua promessa de promover a fraternidade, não na sua forma antropocêntrica apenas, mas com todas as formas de vida também, cada uma trazendo a sua contribuição para a teia da vida do planeta.

As gerações presentes começam a exercitar a democracia que precisamos a partir de agora. Nada de ‘palavras vazias e poluidoras’! Compromisso, transparência e consequência são as novas palavras de ordem. Fraternidade como garantia da igualdade e da liberdade. Como afirmou Amartya Sen, a função do desenvolvimento é a liberdade! Não haverá democracia sem sustentabilidade. E o desenvolvimento sustentável, por sua vez, pressupõe a radicalização dos valores democráticos. Uma outra cidadania é possível? Uma outra cidadania é inadiável!

 

Dia 08/11


Por Luiz Eduardo Rielli

 Entendendo esse megaevento internacional

A COP, Conferência das Partes, pode ser hoje considerada um megaevento internacional. Assim como os grandes eventos internacionais – as Expos, Olimpíadas ou a própria Rio+20 – aglutinam indivíduos de todo o planeta, com suas visões de mundo, culturas e expectativas em relação ao tema em debate. Políticos, ativistas, celebridades, empresários, líderes religiosos passam pelas salas, exposições e auditórios construindo caminhos a partir de uma pauta mínima pré-definida.

Os encontros presenciais são fundamentais para haver trocas, estabelecer conexões e consolidar empatias pelos desafios dos povos e de seus locais. Nas palavras do presidente da COP26, Alok Sharma, “o Reino Unido fez um imenso esforço para que o encontro ocorresse presencialmente, com os delegados podendo ter conversas olho-no-olho e avançar nas negociações.”

Os esforços se traduzem em muita organização e altos investimentos em conectividade, considerando as restrições e riscos sanitários que a COVID-19 ainda representa. A COP26 é o maior evento internacional presencial da ONU desde o início da pandemia e, assim, muito ainda está sendo aprendido em termos de segurança para os visitantes e para os moradores de Glasgow. Nesse sentido, apenas o essencial tem sido autorizado.

Em termos de estrutura os eventos de Glasgow são agrupados em três categorias:

1.      A Zona Azul: é a área onde ocorrem as negociações oficiais, sob autoridade e segurança das Nações Unidas. Apenas delegados credenciados podem acessar.

2.      A Zona Verde: é o espaço oficial aberto ao público. Estão previstos mais de 200 eventos e 100 exposições. Você pode acessar o conteúdo, ao vivo, pelo canal da COP 26 no YouTube.

3.      Os eventos paralelos (fringe events): tudo aquilo que ocorre em paralelo, fora da programação oficial. São centenas de encontros, que podem ser conferidos no site Climate Fringe e no site Holyrood Events.

4.      As marchas e manifestações estão sendo acompanhadas pelo site COP26 Coalition.

Foto: Adobe Stock

Fora os poucos negociadores representantes dos países, a maioria dos participantes credenciados para a COP26 circula pelos espaços paralelos dos países e organizações internacionais (ex.: Banco Mundial, Agência Internacional de Energia). Há um forte risco de muitos participantes não terem uma agenda bem definida e a ida à COP26 virar uma passarela para relacionamento. Apesar de válido, os impactos ambientais de um megaevento são enormes e devem ser evitados.

 

Dia 06/11


Principe Charles, ao centro, ao lado de governadores do Brasil e membros das comitivas durante encontro na COP26, em Glasgow. Foto: Tina Norris / Divulgação

Por Ricardo Young

Brasil pode recuperar o protagonismo perdido

A reunião em que os governadores e seus representantes, de 24 estados brasileiros, tiveram com o príncipe Charles nos dá uma sinalização bastante importante. Uma das grandes discussões durante essa COP é a mobilização do setor privado para investimentos. E todos nós sabemos que o príncipe Charles tem sido um expoente na liderança de fundos para investimentos verdes.

Quando vemos a maioria dos governadores e o príncipe reunidos, nós temos dois elementos muito poderosos: de um lado, a força dos governos subnacionais, ou seja, a agenda verde não dependerá só do Governo Federal. Como nós já vínhamos observando, a Coalisão de Governadores Pelo Clima cresceu muito e agora tem protagonismo, identidade própria e interlocução direta com representantes de estado e representantes de investidores.  Do outro, o príncipe Charles mesmo não sendo representante de estado, é uma presença extremamente simbólica, pois ele canaliza e tem diálogo com muitos investidores de porte mundial, além do aspecto simbólico de ser da família real britânica.

O que podemos ver é que a Coalisão dos Governadores começa a ter interlocuções poderosas. Isso significa que, assim que o artigo 6, do Acordo de Paris, for regulamentado em Glasgow, vamos ver bilhões de recursos fluindo para investimentos verdes nas mais diversas formas; desde green bonds, que são linhas de empréstimos bastante acessíveis e interessantes do ponto de vista das taxas de juros e oportunidade, passando por fundos de investimentos em compensação de carbono, mercado voluntário de carbono até projetos de captura e aterramento de carbono. Este fluxo de novos investimentos trará impactos crescentes em muitas atividades econômicas, tais como infraestrutura, reflorestamento, serviços ambientais, energia limpa, economia circular e inovação tecnológica em sustentabilidade, só para citar algumas.

Então, estamos num momento em que as empresas brasileiras e as multinacionais aqui localizadas precisam estar preparadas, pois podemos estar diante de uma situação sui generis, onde a oferta de recursos possa ser maior que a capacidade de demanda na emergente economia verde. Estamos vendo novos interlocutores governamentais que não só o Federal, fundos importantes – e a presença do príncipe Charles dá uma grande força a essa ideia – além da mobilização já anunciada de bilhões do setor privado, para a área de florestas. Precisamos nos preparar!

É a hora do Brasil se preparar porque nós podemos, sim, dessa vez dar um enorme salto para frente e recuperarmos o atraso de dez anos, onde o país não só andou de lado, como se descapitalizou ambientalmente como potência ambiental.

Já vemos algumas lideranças empresariais brasileiras importantes se posicionando de forma mais ousada nesse sentido. Um exemplo, vindo do Brasil é do presidente da JBS, Gilberto Tomazoni, que não só se colocou a favor do acordo de redução das emissões do gás metano (gás pesadamente emitido pela fermentação entérica do gado), como vem estabelecendo novas parcerias para neutralizar o gás nos rebanhos, por meio de suplemento nutricional. Isso nos traz otimismo, pois representa uma inspiração para outros líderes no sentido de tomar a iniciativa e aproveitar a oportunidade, ao invés de negar ou protelar a irreversibilidade dessas mudanças.

Em nível mundial, os dez maiores produtores de commodities agrícolas, cujas receitas combinadas somam quase 500 bilhões de dólares, assinaram um compromisso compartilhado para conter a perda de florestas associada às suas produções e comércio.

Eles reconhecem que os progressos até então são louváveis, mas devem ser acelerados e ampliados, a fim de apoiar os esforços globais para alcançar emissões líquidas zero globalmente até 2050. E ainda assumiram o compromisso de, até a COP27, traçar um roteiro compartilhado para uma ação aprimorada da cadeia de abastecimento consistente com um caminho de 1,5 ° C.

Anotem o nome desses dez executivos, dentre eles três brasileiros, pois ao assinarem esse documento de compromisso estão dando um passo histórico em prol do meio ambiente, passo esse que esperamos celebrar muito em breve. São eles:

Juan Luciano (ADM), Judiney Carvalho (Amaggi), Gregory Heckman (Bunge), David MacLennan (Cargill), Wei Dong (COFCO International), Franky Oesman Widjaja (Golden Agri-Resources), Gilberto Tomazoni (JBS), Michael Gelchie (Louis Dreyfus Company), Marcos Mulina (Marfrig), Sunny Verghese (Olam International), David Mattiske (Viterra) e Kuok Khoon Hong (Wilmar International).

 

Dia 05/11


Por Luiz Eduardo Rielli

Transições baseadas em pessoas

A transição para uma economia de baixo carbono certamente trará impactos em todas as indústrias e mercados. Como toda transição tecnológica estrutural, haverá ganhadores e perdedores. Basta fazer um breve paralelo ao passado. A revolução industrial, por exemplo, substituiu a tração animal e a força humana por máquinas a vapor, aumentou brutalmente a eficiência no uso de recursos e a escala da produção, mas melhorou as condições de trabalho das pessoas?

As transições trazem novas práticas, com rotinas, significados e competências distintos, mas não necessariamente melhoram a qualidade de vida ou a qualidade do ambiente no mesmo momento ou para todos. Os efeitos sobre o sistema podem ser cascateados com o tempo. Nesse sentido, aprender com as dinâmicas do passado e planejar interações e efeitos parece ser sábio nesse momento.

Recente relatório da Agência Internacional de Energia, apresentado na COP26, traz esse tipo de avaliação e reforça a preocupação de que a transição para uma economia de baixo carbono só trará benefícios, se colocar as pessoas em primeiro lugar. A mensagem é inequívoca: os novos arranjos e acordos precisam considerar efeitos sobre emprego, inclusão e acesso.

No caso das energias renováveis, o relatório traz como cenário a criação de empregos diretos e na cadeia como um todo (como mostra a figura abaixo). Isso se dará na construção com retrofits e eficiência energética de edificações, na indústria e em todos os demais setores relacionados. Esse tem sido também o discurso de líderes políticos, como nos discursos finais do presidente norte-americano Joe Biden: “eu vejo a transição de carbono como uma oportunidade para todos. Uma transição que criará empregos.”

Crescimento de emprego no setor de energias renováveis

Figura – Crescimento de emprego no setor de energias renováveis até 2030, considerando cenários dos compromissos (NDCs) já apresentados e em cenário Emissões Líquidas Zero. Fonte: IEA – World Energy Outlook 2021

O problema é que as transições aceleram os efeitos de deslocação, ou seja, empregos criados não necessariamente ocorrem nos locais nos quais os empregos são perdidos. O mesmo ocorre em relação à transferência de tecnologias, conhecimentos e habilidades. Nesse sentido, governos, empresas e sociedade civil têm um papel fundamental a prestar na mitigação desses desequilíbrios.

Está claro que a transição de baixo carbono será também uma transição para as pessoas. Assim, é necessário compreender esses movimentos e preparar planos de longo prazo e ações efetivas para preparar as pessoas e criar oportunidades. Dar um empurrão para que pessoas e suas comunidades possam se beneficiar das transformações. É também um bom momento para lidar com desigualdades estruturais como, por exemplo, o equilíbrio da presença das mulheres nos novos mercados de trabalho.

 

Dia 04/11


Por Luiz Eduardo Rielli

As propostas brasileiras para conter as mudanças do clima

Apresentado em recente pronunciamento oficial da Presidência da República como ‘parte da solução e não do problema’, o Brasil chega à Glasgow em posição bastante contestada e fragilizada.

Sendo o uso do solo a principal fonte de emissões do país, as recentes queimadas e o desmatamento da Amazônia e do Cerrado têm reforçado a preocupação com a erosão das contribuições brasileiras ao enfrentamento das mudanças do clima. Segundo relatório da ONG Observatório do Clima (1), o país aumentou as emissões de gases de efeito estufa em 9,5% em 2020, enquanto muitos países vêm na trajetória oposta.

Adicionalmente, considerando os compromissos assumidos perante a ONU (NDCs – Nationally Determined Contributions), o Brasil foi o único do grupo das maiores economias mundiais que aumentou suas emissões. Os sinais dos esforços brasileiros estão claramente trocados.

Relatório de emissões unep

Fonte: UNEP, 2021- Emissions Gap Report 2021.

Como mencionado ontem nesse boletim, o governo tem acertadamente adotado uma nova postura na comunicação institucional, nos relacionamentos e nas ações. É aqui que vale a pena se debruçar e entender o que de fato o país se propõe. As ações até o momento apresentadas são:

1. Novo Pacto pela Proteção das Florestas – grande marco nas negociações, busca conter o desmatamento de florestas. Com mais de 100 países aderindo, representando 85% das florestas globais, tem o Brasil como signatário e potencial beneficiário.

2. Plano Nacional de Crescimento Verde – supostamente um conjunto de programas e iniciativas do Governo Federal brasileiro para alavancar o crescimento econômico e o emprego, baseados em tecnologias limpas e nos recursos naturais. Apesar das boas intenções, o que foi apresentado até o momento é bastante vago, sendo difícil dizer qual o real efeito dessa política.

Leia o decreto na íntegra

Confira a notícia sobre o lançamento do Programa Nacional de Crescimento Verde.

3. Nova Meta Climática – o Ministério do Meio Ambiente apresentou uma nova meta climática, buscando reduzir a emissão de gases de efeito estufa em 50% até 2030 e neutralizar a emissão de carbono até 2050. Como o ditado diz, ‘o diabo mora nos detalhes’. Até o momento, não foi definido sobre qual ano base essa redução ocorrerá, não sendo possível entender a real contribuição proposta. De acordo com o Observatório do Clima “Se quisesse apresentar um compromisso compatível com o Acordo de Paris, a meta deveria ser de pelo menos 80% de corte”.

4. Plano de Redução de Metano – uma das cartas apresentadas pela administração americana do presidente Biden, busca reduzir as emissões de metano nas operações de óleo e gás, especialmente em novos investimentos. O Brasil é um dos 100 países que aderiram ao plano.

Confira o plano americano para redução de emissões.

Ao avançar na implementação dessas medidas o Brasil pode se beneficiar e aproveitar novas oportunidades. Ainda há mais dias pela frente, mas esses já são avanços que a COP26 poderá contabilizar.

 

Dia 03/11


Ministro do Meio Ambiente Joaquim Lopes anuncia novas metas climáticas do Brasil em evento realizado em Brasília e transmitidos em telões do estande do País na COP26. Foto: Divulgação / MMA

Por Luiz Eduardo Rielli

Quais agendas relevantes para atores brasileiros?

As negociações de clima continuam atraindo muito interesse dos atores brasileiros. Glasgow não está sendo diferente. É, certamente, uma das maiores delegações de representantes brasileiros em uma conferência sobre clima. É difícil precisar a quantidade de brasileiros presentes nos eventos mas, como exemplo, apenas vinculados à Rede Brasileira do Pacto Global estão previstos mais de 50 representantes do setor privado.

Em grande medida, os atores brasileiros (empresários, ONGs, governos locais, jovens) presentes na COP26 fazem um contraponto ao Governo Federal. Após um período em que o governo brasileiro ruidosamente abdicou do protagonismo na agenda ambiental, parece que silenciosamente vai buscando reatar relações. Nesse encontro, o governo brasileiro vem tentando retomar as suas narrativas ambientais e demonstrar que ‘não é tão ruim, quanto parece’. Assim, toma mais ações na comunicação (ex.: um Pavilhão Brasil e peças de comunicação), no relacionamento diplomático (ex.: convites prévios a representações diplomáticas) e na oferta de novos compromissos (ex.: neutralidade carbônica, fim do desmatamento de florestas e redução de emissões de metano). São ações louváveis.

Entretanto, o isolamento e desconfiança continuam evidentes. Não se trata apenas de diferenças de posições políticas ou de visões de mundo. Nas palavras de um diplomata britânico, “como costurar um acordo com o Brasil se as palavras não são cumpridas?”. Confiança e compromisso são princípios básicos para avançar em qualquer acordo.

É nesse contexto que a sociedade civil e os governos locais ganharam espaço, no vácuo deixado pelo governo federal. Se o Governo Federal abdicou de recursos milionários do Fundo Amazônia, os estados e municípios têm buscado meios para efetivar o interesse em parcerias internacionais. As empresas brasileiras de classe mundial e exportadoras buscam mostrar que estão preocupadas e atuando para reduzir suas pegadas ambientais, com controles em suas cadeias de suprimentos. A juventude e as ONGs vocalizam os abusos e os desafios locais, estendendo a mão para a ajuda da comunidade internacional. Ou seja, o Brasil se apresenta na COP26 muito além do Governo Federal.

Por ação ou omissão, o Brasil passou de líder a ignorado. O país que abdicou ao seu lugar no mundo de ‘potência ambiental’ precisa retomar uma agenda de equilíbrio entre desenvolvimento e preservação de sua riqueza natural. Nesse sentido, os atores brasileiros têm um papel fundamental na COP26.

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Por Ricardo Young

Um sopro de vida em meio ao ódio

Txai, em língua indígena da tribo Paiter Surui, significa ‘aquela parte de mim que vive em você; a parte de você que vive em mim’. E foi assim que a jovem mulher Txai-Surui abriu a participação brasileira na COP26 em Glasgow.

Na linha de Svern Suzuki na Rio-92 ou mesmo de Greta Thunberg na COP24 na Polônia, Txai exaltou aos chefes de estado a colocarem fim à “poluição das palavras vazias, às mentiras vazias e às falsas promessas”. Mas trouxe uma outra dimensão em sua curta fala. Disse que seu povo habita há mais de 6000 anos a Amazônia e que aprenderam a ouvir “as estrelas, a lua, o vento, os animais e as árvores” e que “a Terra clama: não temos mais tempo” e que “os povos originários estão na fronteira da emergência climática e por isso precisam estar no centro das decisões.”

A participação de Txai na abertura da COP26 é para lá de emblemática. Primeiro, o presidente não compareceu; segundo, foi a única fala brasileira no evento que reuniu chefes de estado e lideranças mundiais; terceiro, Txai é jovem, mulher e indígena; quarto, trouxe a lembrança de que sem a participação dos povos originários não haverá solução à proteção das florestas.

Enquanto Txai crescia participando de redes sociais, de movimentos de defesa da floresta e dos povos indígenas, organizando a juventude indígena, tendo um papel importante nas recentes manifestações em Brasília sobre o Marco Temporal e se preparando para ser advogada, surgiu a nova realidade: há uma geração de povos indígenas que se equipou para além de seus saberes ancestrais, para protagonizar seus direitos e o das florestas na sociedade global.

Isto coincide com o novo posicionamento da ciência em relação aos conhecimentos ancestrais que não só repercute o que Txai afirmou de que “os povos originários precisam estar no centro das decisões”, como reconhece que, para além de guardiões da floresta, seus conhecimentos sobre sistemas naturais, regeneração de espécies e serviços ecossistêmicos são uma parte integrante das soluções e do esforço coletivo a ser empreendido para a redução do impacto das mudanças climáticas.

O antigo ensinamento do chefe Seattle expresso em sua emblemática carta ao presidente dos Estados Unidos “Tudo quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará” já antecipava um conhecimento sistêmico sobre o funcionamento do planeta, como a Teoria Gaia de James Lovelock sistematizou há algumas décadas.

Portanto, além da singela poesia contida na fala de Txai, ouvir as estrelas e a Lua, implica como a biodinâmica comprova levar em consideração os ciclos cósmicos e seu impacto; ouvir o vento, observar os animais e as árvores significa estar em sintonia com os sinais meteorológicos, a vitalidade da vida e dos serviços ambientais prestados pela natureza. É de ecologia profunda que estamos nos referindo, é da abordagem complexa e sistêmica que hoje as ciências ambientais tanto necessitam.

Txai traz dentro de si uma longa linhagem de sabedoria ancestral dos povos originários sem a qual, não conseguiremos lidar com o maior desafio já enfrentado pela civilização até hoje. Nos 24 anos de Txai-Surui estão contidas uma sabedoria milenar indispensável à nossa sobrevivência. Estar representado por ela na abertura da COP26 aponta a possibilidade de um Brasil mais potente do que percebemos, um Brasil cujo amalgamento sociocultural, em simbiose com a natureza, o conhecimento ancestral, a ciência, a tecnologia, o empreendedorismo, a equidade e a justiça social, pode contribuir definitivamente para um novo estágio de evolução civilizatória.

Recomendo a leitura da matéria do El País para ampliar a compreensão da importância do tema.

 

Dia 02/11


Líderes do G20 em Roma
Angela Merkel, Mario Draghi, Emmanuel Macron e Boris Johnson durante numa oportunidade de foto dos líderes da cúpula do G20 na Fontana de Trevi, Roma. Foto: Alessandro Serranò /REX /Shutterstock

Por Luiz Eduardo Rielli

Parece que o mundo inteiro só fala na COP26. Em parte, é verdade. Considerando a cobertura da grande imprensa internacional, certamente é o evento internacional mais mencionado e procurado nos últimos dois dias. Mas, enquanto para a maior parte da população global as negociações climáticas são desconhecidas, os seus efeitos sobre o tempo e suas mudanças são certamente de grande interesse.

O encontro de Glasgow é considerado fundamental pois a “janela de tempo” para restringir os efeitos brutais e desconhecidos das mudanças do clima está se fechando. É crucial ter avanços, compromissos com reduções de emissões reais e uma rota acordada que seja segura para todos. Deixar países e comunidades para trás não é uma opção.

Por isso, a presença de 120 líderes mundiais em Glasgow indica o interesse político na temática. Por outro lado, a ausência de atores importantes como os chefes de governo do Brasil e da China dificulta que grandes saltos sejam obtidos. Adicionalmente, havia muita expectativa que avanços reais fossem debatidos durante a reunião do G20, na Itália. O centro de poder global poderia ter dado o necessário empurrão ao tema.

A grande novidade para a COP26 poderia ser a participação fortalecida dos Estados Unidos. Apesar de ontem propor uma versão global do Build, Back, Better – seu mote de governo – o presidente Biden tem encontrado dificuldades em seu próprio partido para mobilizar o Congresso Americano em seu plano de descarbonização da economia. Sua proposta de transição energética enfrenta resistências e arranjos institucionais difíceis de desatar: lobbies das Big Oil, sindicatos, interesses políticos locais.

Parece que todo mundo realmente só fala na COP e as expectativas são altas. O contexto político, entretanto, parece não ser favorável a grandes avanços.

As circunstâncias desse encontro são completamente especiais, considerando o contexto global. A COP prevista para ocorrer no Brasil foi cancelada por posições ideológicas do governo brasileiro. Em seguida, a convulsão social no Chile fez com que o encontro fosse acolhido por Madrid. Por fim, a pandemia postergou o encontro da COP26, no Reino Unido. Se por um lado, os encontros políticos foram postergados, os efeitos extremos do clima continuam a afetar a todos e a ciência é mais clara do que nunca da urgência de ações. As pressões por respostas são crescentes.

 

Dia 01/11


Synergia na COP26

António Guterres, Secretário Geral das Nações Unidas na
Cúpula dos Líderes Mundiais, COP26 (Crédito UNFCCC)

Por Luiz Eduardo Rielli

A COP26 – Conferência das Partes – da Convenção quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima iniciou formalmente ontem, em Glasgow, com a abertura dos trabalhos e a presença de equipes técnicas. Entretanto, a presença dos chefes de estado e de governo na manhã de hoje inicia oficialmente as negociações, com altas expectativas sobre os meios para tornar efetivas as ambições e o caminho acordado no Acordo de Paris, em 2015.

Nas inspiradoras palavras da primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, “Glasgow precisa entregar as promessas de Paris”. Serão necessárias mais do que palavras. Serão necessárias novas ambições e ações concretas.

Em termos técnicos, são quatro os principais eixos nos quais a presidência do encontro, do governo britânico, vem colocando prioridade. São eles:

1) Mitigação – assegurar que as emissões globais alcancem níveis líquidos iguais a zero e manter a ambição de aumento máximo da temperatura global média ao final do século em 1,5°C. Encorajar novos compromissos de emissões liquidas zero. Compromissos dos países (NDCs) mais ambiciosos e ações de curto prazo.

2) Mobilização para financiamento – alcançar os US$100 bilhões por ano prometidos na COP15, em Copenhagen, possibilitando alavancar os trilhões necessários em parcerias com o setor privado. Aumentar o acesso de recursos para adaptação e transferência tecnológica, especialmente de países insulares e os menos desenvolvidos. Segundo dados recentes da OCDE, ainda há um gap de US$20 bilhões por ano, que poderá ser alcançado apenas a partir de 2023

3) Adaptação – apoiar todos os países a adotarem estratégias de adaptação, evitando efeitos destrutivos das mudanças do clima.

4) Colaboração – terminar as pendências do caminho acordado em Paris e que precisam ser especificadas. Avançar em temas de energia, transporte e uso da terra. Avançar no tema do novo mercado de carbono (Art. 6°)

Essa é a agenda que está em cima da mesa, mas que certamente não será alcançada em sua plenitude. Como todo processo político e negocial, as posições são colocadas de maneira ambiciosa e a construção de consensos e pontes reduz a amplitude do acordo. São muitos os subtemas que estão em aberto e que requerem esforços dos negociadores. Por fim, apesar de ter a presença de importantes chefes de estado, a COP26 inicia sem um grande empurrão do encontro do G20 na Itália e de países centrais como Estados Unidos e China.

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Por Ricardo Young

Hoje o clima na COP continua sendo de bastante determinação e entusiasmo. Cento e vinte líderes mundiais estiveram presentes na abertura e esta é a última e melhor oportunidade para manter a temperatura no máximo em 1,5° até 2050.

Esse entusiasmo está sendo vocalizado pelos principais líderes. O Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, usou uma expressão até bastante forte, dizendo que “chega de a humanidade tratar a natureza como toilette.” Na verdade, ele foi sutil, porque o que ele quis dizer foi ‘tratar a natureza como lixo, como banheiro da humanidade’.

Ele não disse isso de graça, pois o relatório da Associação Mundial de Meteorologia acabou de publicar que os últimos cinco anos foram os mais quentes desde 1850. As evidências são absolutamente claras de que essa COP é uma COP de ação, é uma COP para fazer as coisas acontecerem.

Um outro dado, bastante preocupante, foi sobre os efeitos da crise climática sobre a África. No relatório, feito pela FDA (Fundo Internacional das Nações Unidas para o Desenvolvimento Agrícola) dá conta de que é possível que, se assim continuar até 2050, a produção de commodities agrícolas pode cair em até 80% aumentando a situação de pobreza, num continente onde o próprio Secretário Geral das Nações Unidas reafirmou estar hoje com apenas 5% de sua população coberta pela vacina contra a COVID.

Então, o olhar para a África se intensifica, o olhar é politicamente conveniente também por causa das imigrações em massa da África para o continente europeu, mas também porque a tragédia na África se amplificou bastante.

Agora, existe uma ótima notícia, um documento que foi lançado há pouco, às 18h, pois estava embargado até então, em que mais de 100 líderes do mundo todo se comprometem a evitar o desmatamento. Esse documento é realmente surpreendente, porque é uma promessa histórica de mais de 100 líderes que representam mais de 85% das florestas do mundo, estão se comprometendo a reverter o desmatamento e a degradação da Terra até 2030.

Ao mesmo tempo, se comprometem a mobilizar 12 bilhões de dólares de fundos públicos para proteger e restaurar florestas, além de 7 bilhões de dólares já mobilizados pelo segmento privado. Este está sendo considerado o maior passo adiante na proteção de florestas do mundo de toda uma geração, e também uma mobilização robusta de recursos que estão chegando a quase 20 bilhões de dólares.

Os países envolvidos vão do Norte do Canadá, Rússia, incluindo as estepes russas na Sibéria, até as florestas tropicais no Brasil, Colômbia, Indonésia, República Democrática do Congo, todos eles estão nessa declaração. Isso traz ao Brasil uma posição bastante interessante, porque o Brasil se alinhou a esses países, se alinhou também aos compromissos financeiros, mas não teve protagonismo. O Brasil não falou durante esse evento. Falaram os presidentes da Colômbia, da Indonésia, o primeiro-ministro da Noruega, o coordenador da Aliança Global das Comunidades Territoriais, entre outros.

Essa é uma notícia muito alvissareira e de uma certa forma antecipa a expectativa de que o artigo 6 do acordo de Paris seja regulamentado, porque as florestas serão, provavelmente, o mecanismo mais eficaz para a neutralização de carbono nas próximas décadas.

 


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Synergia na COP26_ Luiz Rielli

Luiz Eduardo Rielli

Especialista em estratégias de sustentabilidade e desenvolvimento
internacional, com experiência em mercados de infraestrutura e energia
da Europa, América Latina e África. Liderou a área de sustentabilidade
da AES Brasil e o Instituto AES, como diretor-executivo. Ocupou
posições executivas na CPFL Energia e InterCement e foi conselheiro
da Fundación Loma Negra, na Argentina. Msc in Ecological Economics,
pela Universidade de Edimburgo, Reino Unido, bacharel em Administração
de Empresas pela Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP) e em
Relações Internacionais pela USP. É sócio da consultoria NOVí e
consultor para sustentabilidade na Synergia Consultoria.

 

Synergia na COP26_ Ricardo Young

Ricardo Young

Membro do Conselho da Synergia, socioambientalista, presidente do
Conselho do Instituto Ethos e do Instituto Democracia e Sustentabilidade,
Membro do GT Cidades Sustentáveis, Integrante do Grupo Estratégico da
Coalização Brasil Clima, Florestas e Agricultura, foi fundador do Movimento
Nossa São Paulo, do Fórum Amazônia Sustentável e do Conselho Todos pela Educação.
Formado em Administração Pública pela Fundação Getulio Vargas, pós-graduado em
Administração Geral no PDG – EXEC, atual Insper, pós-graduado na Teoria U pelo MIT,
doutorando em Sustentabilidade Global pela FSP- USP e membro pesquisador do
IEA – Instituto de Estudos Avançados da USP.

 

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